Skip to content Skip to sidebar Skip to footer

DOSSIÊ FINTECHS: AS MANOBRAS CAMBIAIS NO BANCO CENTRAL DE CAMPOS NETO

Duas resoluções elaboradas durante a gestão de Roberto Campos Neto à frente do Banco Central, sob a justificativa de modernização das normas, acabaram por blindar instituições financeiras de processos criminais e do risco sistêmico.

Uma mudança na legislação cambial, solicitada pelo próprio Banco Central (BC), teve o efeito prático de anistiar cinco bancos sob investigação da Polícia Federal: Master, Genial, Travelex, Santander e Haitong.

Ocorre que Roberto Campos antes de assumir o cargo público, Campos Neto trabalhou no Banco Santander de 2000 a 2018, onde ocupou posições de alta diretoria. Ou seja, o princípio da imparcialidade regulatória foi fundamentalmente desafiado.

ENTENDENDO O CASO

A investigação, batizada de Operação Colossus, apurava um esquema bilionário de evasão de divisas e lavagem de dinheiro. As investigações não apenas revelaram que a rede, que movimentou R$ 61 bilhões em quatro anos, lavava dinheiro para o Primeiro Comando da Capital (PCC), como também mantinham elos com o terrorismo internacional.

O pilar jurídico do caso da Polícia Federal se baseava no princípio da responsabilidade compartilhada entre bancos e clientes na classificação das operações de câmbio, um padrão em vigor desde 1962. 

A nova lei, regulamentada pela Resolução 277 do BC, transferiu essa responsabilidade inteiramente para o cliente. Com isso, a base legal para a acusação foi eliminada, efetivamente apagando o crime pelo qual os bancos estavam sendo investigados. As condutas, ocorridas entre 2017 e 2022, deixaram de ser ilegais sob o novo marco, tornando a persecução penal impossível.

No centro dessas mudanças regulatórias estava Roberto Campos Neto, presidente do Banco Central. Antes de assumir o cargo público, Campos Neto trabalhou no Banco Santander de 2000 a 2018, onde ocupou posições de alta diretoria, incluindo a de chefe global de trading estruturado e renda fixa para mercados emergentes.

A conexão com a Operação Colossus é direta: o Santander foi um dos cinco bancos investigados, com quebra de sigilo telemático autorizada pela Justiça por operações suspeitas realizadas a partir de 2017, período em que Campos Neto ainda era um alto executivo na instituição. 

A Resolução 277, que transferiu a responsabilidade dos bancos para os clientes e na prática os anistiou, foi editada em 31 de dezembro de 2022, sob a gestão de Campos Neto à frente do BC.

Pode-se dizer que essa manobra foi um desmantelamento retroativo do arcabouço legal sobre o qual uma investigação federal multibilionária foi construída – tanto que a conclusão da Polícia Federal sobre a conduta dos bancos foi taxativa:

“…constatado a existência de ‘cegueira deliberada’ para irregularidades do mercado câmbio e para a lavagem de dinheiro por parte dos bancos.”

RISCOS ESCONDIDOS

Os benefícios a bancos específicos não se limitaram à anistia cambial. Em outubro de 2023, o Banco Central editou outra norma que permitiu ao Banco Master — um dos cinco investigados na Operação Colossus — não contabilizar o risco de bilhões em ativos de alta periculosidade, como precatórios e direitos creditórios.

O mecanismo contábil, embora técnico, foi extremamente eficaz. O Índice de Basileia exige que os bancos tenham capital próprio para cobrir os riscos de seus ativos. 

A nova norma do BC aumentou drasticamente o fator de risco para precatórios, mas criou uma “data de corte”: 30 de junho de 2023. Ativos de risco adquiridos antes dessa data não precisaram ter seu risco recalculado.

Essa brecha foi uma tábua de salvação para o Banco Master. A instituição, que nos últimos três anos quase quadruplicou sua carteira nesses ativos (de R$ 2,25 bilhões para R$ 8,73 bilhões), já operava com um Índice de Basileia de 11,54%, perigosamente próximo do mínimo de 10,5%.

Se a nova regra fosse aplicada aos seus ativos, o fator de risco os multiplicaria por 13,5 vezes, fazendo seu peso no balanço explodir para R$ 76 bilhões, provocando um colapso do seu índice. 

A manobra permitiu que o banco, conhecido por práticas agressivas como captação de recursos via CDBs de alta rentabilidade e gastos de R$ 600 milhões em “serviços especializados” evitasse uma crise de capital. 

Na ocasião, o BC afirmou que agiu para “evitar efeitos adversos nos mercados” e que o objetivo era “aprimorar o tratamento prudencial de exposições a precatórios e direitos creditórios” dos bancos.

Porém, essa manobra não englobou todo o mercado, tratando-se especificamente de uma intervenção direcionada com um impacto desproporcionalmente positivo em um dos mesmos bancos — o Banco Master — que se beneficiou da anistia cambial. 

Esta segunda instância reforça o padrão de ações regulatórias específicas que fornecem uma rede de segurança para instituições já sob escrutínio por má conduta grave.

Sob o discurso de “modernização” e “desburocratização”, uma série de mudanças regulatórias no Banco Central acabaram por blindar grandes instituições financeiras.

Enquanto o Santander, ex-empregador de Campos Neto, foi beneficiado por uma anistia que neutralizou uma investigação federal, o Banco Master, também investigado, foi salvo de uma crise de capital por uma manobra contábil sob medida.

Fonte: Contraf-CUT

Leave a comment