Os bancos estão em outro mundo. Isso ficou claro diante das argumentações apresentadas pela Fenaban sobre as reivindicações dos bancários na Campanha Nacional Unificada 2016. Na rodada de negociação realizada na quarta-feira 24, os representantes do BB, Caixa, Itaú, Bradesco e Santander, que compõem a mesa da federação dos bancos, defenderam o indefensável: que o setor não é o mais lucrativo do Brasil e mesmo assim paga excelentes salários, que não têm alto grau de risco para a saúde e não adoecem seus funcionários.
Essa foi a reação aos números apresentados pelo Comando Nacional dos Bancários nas duas primeiras rodadas de negociação realizadas nos dias 18 e 19.
“Provamos com dados que o setor bancário, mesmo na crise, segue lucrando muito e pode pagar mais aos seus trabalhadores e parar com as demissões que já extinguiram 6.785 postos de trabalho somente nos seis primeiros meses deste ano. O que eles tentaram nessa rodada de hoje é provar o impossível. Os números não mentem”, afirma a presidenta do Sindicato de São Paulo, Juvandia Moreira, uma das coordenadoras do Comando. “Dia 29 queremos uma proposta concreta que atenda às reivindicações da categoria.”
Aumento real – Os bancários querem aumento real para os salários, valorização do piso, da PLR, dos vales. Mas os bancos dizem que já pagam demais e que é preciso criatividade para definir campanha deste ano. “Criatividade é pagar aumento real”, afirma Juvandia. “Os bancos estão chorando de barriga cheia.”
PLR – A cada ano parcela menor do lucro é distribuída aos bancários e isso tem de ser corrigido. Os bancos, no entanto, querem manter a mesma base de cálculo, somente com reajuste dos valores de acordo com o que for convencionado e afirmam que mesmo não sendo o setor mais lucrativo, pagam mais que outros.
A consultoria Economatica, no entanto, avaliou 25 setores que envolvem 300 empresas de capital aberto, e desses, os bancos foram o mais lucrativo no primeiro trimestre do ano: 21 instituições alcançaram R$ 14,3 bilhões. “Os bancos tiveram muito lucro sim e têm condições de pagar mais”, reforça Juvandia.
Auxílio-educação – Dos grandes bancos, somente o Bradesco não paga auxílio-educação aos seus funcionários. Todos os bancários querem ter esse direito, mas a Fenaban diz ser impossível fazer uma cláusula nesse sentido. O Comando rebate, afirmando que pode haver sim o direito do pagamento a todos, com critérios e quantidades discutidos banco a banco. Isso custaria pouco para as instituições e significaria muito para os trabalhadores.
Parcelamento de férias – A categoria reivindica o parcelamento do valor pago nas férias. Os bancos informaram que farão o debate, mas querem condicionar isso ao parcelamento dos 30 dias de férias. “Uma coisa não tem nada a ver com a outra”, critica Juvandia. “Isso acirraria um conflito que já existe: muitos bancários denunciam que querem tirar de uma vez os 30 dias a que têm direito e não conseguem. Férias é um direito.”
O Comando informou aos representantes da Fenaban que realizou debates e consultas em todas as bases do Brasil e que nenhuma conferência regional apontou que os bancários queiram parcelar os 30 dias das férias.
Vale-cultura – Os bancários cobram a renovação do vale-cultura. Se a legislação federal, que tem duração prevista até dezembro não for renovada, o pagamento dos R$ 50 ao mês pode acabar. “O Comando propôs que bancários e bancos cobrem juntos do Congresso Nacional a renovação da lei, mas os bancos quiseram levar outros interesses deles junto e isso não topamos”, relata a secretária-geral do Sindicato, Ivone Silva.
Igualdade de oportunidades – O Comando foi novamente enfático na questão da mulher: as bancárias têm salários mais baixos, dificuldades na ascensão profissional e isso tem de mudar. Os negociadores da Fenaban primeiro alegam que não há diferença salarial e depois que essa diferença é característica do mercado de trabalho em outros setores e no mundo. Também afirmam que elas ficam menos tempo no emprego, o que dificultaria a ascensão, mas os dados do Censo da Diversidade da própria Fenaban não mostram isso: trabalhadores com mais de cinco anos de casa dividem-se entre 63% homens e 60% mulheres.
Emprego x tecnologia – Para a Fenaban, os bancos são os melhores empregadores do Brasil, “mesmo não sendo os mais lucrativos”. O Comando lembrou que o número absoluto de empregados vem caindo. Para eles isso é coisa natural, de ajuste, da tecnologia que ajuda o cotidiano e possibilita melhor distribuição da carga de trabalho. “Não somos contra a tecnologia, mas isso é o inverso do que a gente está vendo nos locais de trabalho”, critica Ivone. “As pessoas que estão indo para agências digitais têm o dobro de clientes na carteira, ficam oito horas no head set. Somente 27% dos trabalhadores de bancos privados têm a jornada de seis horas respeitada. Tecnologia tem gerado ganho somente para os banqueiros”, reforça. “Vamos insistir no debate de como proteger empregos que estão sendo atingidos pela tecnologia.”
Saúde – Para a Fenaban, a CCT já tem cláusulas de saúde demais, que precisam ser aprimoradas e aplicadas efetivamente. “Ou seja, a própria Fenaban reconhece que precisam ser mesmo cumpridas e concordamos. Mas também precisamos de novas cláusulas para por fim ao assédio moral, ao sofrimento mental. O trabalho não pode adoecer”, afirma Ivone.
Sobre a revisão de atestados, informaram que não fazem com todos. “Reforçamos que isso tem de acabar. Não podem revalidar atestado, isso é proibido pelos conselhos de medicina, pelo código de ética médica.”
Segurança – Os bancos não querem debater a extensão da assistência em caso de assalto, sequestros ou extorsões aos familiares dos bancários que tiverem sofrido a violência. “Mas têm de fazer isso. Afinal, esses familiares não teriam sofrido a violência se não fossem parentes dos funcionários com acesso ao dinheiro”, ressalta Ivone. Diante da cobrança do Comando, os bancos ficaram de rediscutir o assunto.
O Comando reforçou também que não aceita a revista feita aos trabalhadores na saída das agências e lembrou que, além de ação sindical, isso pode redundar em ação judicial. “Deixamos claro que não concordamos, mas eles não querem colocar nada sobre isso na CCT.”